segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Revista Autismo

Recebi o email, pedindo divulgação.
Assim, transcrevo:

Brasil terá a primeira revista sobre autismo da América Latina
O Brasil está prestes a ter a primeira revista sobre autismo em toda a América Latina e a única em língua portuguesa no mundo. Neste mês de agosto (2010), será lançada a Revista Autismo e o site RevistaAutismo. com.br com muito material sobre o assunto. Também no Twitter a publicação tem um canal para divulgação e interação (@RevistaAutismo).

A revista será impressa, de circulação nacional e gratuita. Haverá também uma versão eletrônica, online com 100% do conteúdo, além de material extra para ser compartilhado, com acesso irrestrito. O objetivo é levar informação a profissionais e principalmente a pais envolvidos com o autismo, ajudando essencialmente aos que não têm acesso à internet (ou habilidade com a tecnologia), além de democratizar a informação sobre autismo e conscientizar a sociedade sobre essa tão complexa síndrome, que precisa urgente de políticas de saúde pública.


Edição zero


A edição de lançamento (número zero) terá artigos de profissionais de renome, como o neuropediatra José Salomão Schwartzman, o médico Walter Camargos Jr., especialista em Psiquiatria da infância e adolescência, a médica Simone Pires, especialista em Protocolo DAN!, entre muitos outros textos de qualidade.

Para o material extra de cada artigo, a Revista Autismo utiliza a tecnologia de QR Codes (saiba mais aqui), uma espécie de código de integração de mídias, que pode ser lido por celulares com câmera e webcams em computadores, ligando o leitor a um material online complementar e atualizado.

Segundo o editor-chefe da revista, o jornalista Paiva Junior (@PaivaJunior), "o lançamento da publicação, que está com ótimo conteúdo e um design moderno, será um marco para o autismo no Brasil".

Então anote na sua agenda: agosto de 2010 é o mês de lançamento da Revista Autismo, que estará, na íntegra, no site http://www.revistaautismo.com.br/ para você ler e divulgar.

Acabei de conferir e é ótimo!
Vale à pena conferir e recomendar.

Beijos a todos.

domingo, 24 de outubro de 2010

Aos amigos com carinho

Descobrir que seu filho é portador de uma necessidade especial não é fácil! Honestamente falando, nenhuma mãe, quando está grávida, sonha em ter um filho autista, PC, down, ou portador de qualquer necessidade especial. Pode parecer cruel falar isso assim, “na lata”, mas é verdade. Toda mãe idealiza seu filho, faz planos, acredita poder livrá-lo de todo e qualquer mal.

Mas mãe é mãe. E quando nasce um filho, nasce também uma mãe, pronta a atender seu pequeno em todas as suas necessidades: é seu leite que o alimenta, seu corpo que o acolhe, sua voz que o acalma. O bebê, nos primeiros meses de vida sente-se um extensão do corpo da sua mãe.

E se este bebê tem alguma necessidade a mais, sem dúvida, a primeira pessoa que estará pronta a atendê-la será a sua mãe.

Acredito que toda a família da criança especial, inicialmente, passa por uma fase de negação, que, é preciso que se diga, não significa rejeição à criança. Negação à situação, à possibilidade daquela criança ter algum problema que possa comprometer sua qualidade de vida, quando o que se desejaria é que se pudesse assegurar sua imunidade até a uma singela dor de cabeça.

São muitos por quês que passam pela nossa cabeça. É uma fase de adaptação, que tem um tempo próprio para cada membro da família.

Não foi diferente conosco.

Tive minha fase de negação, embora não tivesse consciência disso. Evitava as conversas de elevadores, para que não me perguntassem quantos meses Leti tinha, quando ela já tinha mais de 1 ano; tentei não ir ao interior de Samir, para não ter que enfrentar os olhares curiosos das pessoas quanto ao estágio de desenvolvimento dela; restringi seu convívio, por algum tempo, às pessoas mais próximas, para não ter que dar explicações a respeito de suas limitações.

Com a suspeita do prader willi, senti uma necessidade grande de dividir minha angústia com outras pessoas.

Até então, tirando Samir, meus pais, Binha, Felipe e Érika, não falava muito sobre o assunto com mais ninguém.

A partir daquele momento, passei a conversar mais com outras pessoas: amigos próximos, colegas de trabalho e alguns familiares. E é impressionante como tudo fica mais leve quando temos com quem dividir nossas angústias, medos e preocupações.

Lembro-me que no dia em que saiu o resultado do exame de prader willi, fiquei um tempão no celular, ligando para todos que estavam torcendo por nós, para dizer que o resultado havia dado negativo. Dividir a alegria também é muito bom!

Samir passou por um processo diferente. Neste mesmo dia do resultado, lembro-me que não ligou para mais que três pessoas. Ele não conversava sobre o assunto. Seus amigos, familiares, colegas de trabalho não conheciam o estresse emocional que estávamos vivendo. Só depois de quase um ano, ele contou a serventuários do fórum que trabalhavam com ele que Leti era uma criança especial, e porque eles logo fariam a constatação ao chegar para jantar em nossa casa.

Mas ele nunca economizou na demonstração de um amor imensurável a sua princess, o que reforça a afirmação que a negação de que falo nada tem haver com rejeição.

Quem conhece Samir, sabe o pai maravilhoso que ele é, daqueles que fazem tudo: dá de comer, nina, dá banho, troca fraldas, acorda de madrugada, leva para passear, assiste (curtindo) dvd junto, acolhe e cuida no momento da doença, percebe quando está com febre, com sede, enche de vontades...

Mesmo vivendo o momento dele de negação, ele sempre foi um pai maravilhoso e apaixonado. E, no tempo dele, venceu a negação e passou a dividir com aqueles que o cercam a certeza de ter como filha uma criança especial, para nós, fonte de inesgotável amor.

Vencida a negação, constatamos a importância dos amigos nessa nova etapa de nossa vida.

Queria, portanto, dedicar esse post aos amigos: Amigos-amigos, amigos-parentes, amigos-colegas de trabalho, amigos-conhecidos, amigos-profissionais. Todos eles possuem um papel importante em nossa caminhada.

Em primeiro lugar, a meus pais, incluídos na categoria amigos-parentes.

Como Samir precisa ficar a semana inteira no interior, por conta do trabalho, fica mais difícil conciliar a vida de profissional, de dona de casa, de mãe de um filho de 8 anos, numa fase de mudanças e descobertas, de mulher e de esposa, com a maratona de Leti, que inclui duas sessões semanais de fisioterapia, fonoaudiologia e terapia ocupacional, além de escola, natação, consultas médicas, dentre outras atividades.

Aí entram meus pais. O suporte que eles me dão, desde o início, permitiu que eu pudesse cuidar da minha filha e da minha vida, sem precisar esquecer-me de mim. Além do apoio efetivo, representado pelo compromisso em levar Leti a algumas de suas atividades, o suporte emocional que eles me dispensam faz a diferença. É impressionante o poder de um colo de mãe na hora em que a vontade de chorar vence nossas forças.

Depois, a minha irmã. Sem dúvida, uma segunda mãe para os meus filhos. Binha é aquela pessoa disponível em todos os momentos, aquela tia carinhosa, apaixonada, cuidadosa, brincalhona. Assume meus filhos a qualquer momento, mesmo tendo um bebê lindo, de onze meses, em casa. É minha grande amiga e confidente, companheira para todos os momentos.

Logo em seguida vêm os amigos. Amigos-amigos, amigos-parentes, amigos-colegas de trabalho, amigos-profissionais que acompanham de perto nossa rotina, que se preocupam, que vibram, que aconselham, que protagonizam conosco a nossa história.

Fico feliz de ter escolhido o caminho da abertura, e não o da reclusão, em relação à questão da minha filha.

Hoje não me sinto mal quando me perguntam quantos meses minha filha tem, respondo, com muita naturalidade, que já tem dois anos, mas que é especial e tem o desenvolvimento compatível com um bebê de idade entre 11 meses e 1 ano. As pessoas se solidarizam, conversam abertamente, não sobra espaço para especulações.

Adoro falar sobre seus progressos e descobertas, sobre minhas dúvidas e preocupações, adoro compartilhar histórias de outras crianças especiais. O blog veio publicizar este movimento.

E como tem sido gostoso receber as manifestações de carinho, através de comentários aos posts e emails, de amigos que conhecem nossa história, de outros que ainda não a conheciam e até de pessoas que, apesar de não fazerem parte do nosso círculo de amizade, já se apresentam como simpatizantes da nossa causa.

A inclusão começa em casa. E começa com a aceitação. Essa etapa para nós está superada. E temos um exército de amigos que nos ajudará a vencer todas as outras que ainda estão por vir.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

FLOORTIME

Começo a escrever este post da sala de embarque do Aeroporto de Recife, aonde cheguei na sexta-feira (08/10/10), para participar de um Workshop de DIR/Floortime, ministrado pela Mestre em Educação Especial Patrícia Piacentini.

É uma característica minha, e não sei de todas as “mães especiais”, oscilar entre momentos de acomodação e outros de grande inquietação quanto à busca por novidades em relação à questão do neuro-desenvolvimento.

Meio envolta neste sentimento de inquietação, tenho-me visto curiosa a aprender um pouco mais sobre floortime, integração sensorial, son-rise, conceitos até pouco tempo completamente desconhecidos por mim.

Assim, dentro deste contexto, logo que soube que haveria este evento em Recife, que teria como público alvo pais e terapeutas, para discutir o Floortime, decidi na mesma hora que me faria presente, ainda que não fizesse a menor ideia do que seria esta técnica.

Volto para Salvador tomada por um sentimento de grande satisfação.

Não que acredite que o floortime seja a solução para todos os problemas da minha filha, mas por ter tido a oportunidade de discutir maneiras de melhor estimulá-la através da brincadeira, de fazer o reconhecimento de sinais de desregulação em crianças autistas (embora ela não tenha diagnóstico fechado no autismo), por ter conhecido profissionais atuantes na área e, principalmente, por ter compartilhado um pouco das sensações que norteiam famílias que se encontram na mesma situação que a minha.

O DIR/Floortime busca a aplicação de conhecimentos interdisciplinares ao mundo do autismo, com a finalidade de sustentar a ideia da individualização no tratamento do transtorno invasivo e nas disfunções sensoriais.

O trabalho através do DIR/Floortime é focado a partir de três aspectos: 1. O estágio do desenvolvimento em que cada criança se encontra (D); 2. O modo individualizado desta criança processar as informações sensoriais (I); e 3. A importância das relações que esta criança estabelece com seus pais (R).

Em relação ao aspecto do Desenvolvimento, distinguem-se seis níveis que são escalonados da maneira referida abaixo, de acordo com a idade da criança:

1)   Interesse pelo Mundo, que corresponde à busca espontânea pelos estímulos do mundo ao redor;
2)   Vínculo Afetivo, como a habilidade da criança se relacionar com diferentes pessoas;
3)   Círculos de Comunicação, caracterizada pela capacidade de estabelecer uma forma de comunicação (ainda que não verbal) com as pessoas que a cercam;
4)   Resolução de Problemas, que corresponde à habilidade da criança criar gestos mais complexos, segurando uma série de ações dentro de uma construção de ideias elaboradas e auto controle no comportamento, ajudando a solucionar problemas;
5)   Criação de Ideias, como a possibilidade de expressar-se ao mesmo tempo através do imaginário e do concreto; e
6)   Construção de Pontes entre Ideias no sentido da habilidade de estabelecer uma conexão lógica no meio das ideias.

Segundo os teóricos do DIR/Floortime, é necessário que a criança garanta bem cada nível do desenvolvimento, para poder subir um degrau para o nível seguinte.

Quanto ao “I”, que representa as diferenças individuais de cada criança, trata-se principalmente da maneira como a criança recebe, processa e integra as informações sensoriais.

Em relação ao processamento sensorial, a abordagem enfatiza três aspectos:

1)      Dificuldades de modulação: onde a criança percebe os estímulos com muita ou pouca intensidade;
2)      Dificuldades no processamento: quando a criança recebe as informações sensoriais, porém apresenta dificuldades em processar e organizar. Ex: dificuldade de processar dois sentidos ao mesmo tempo, de perceber um som principal e um de fundo;
3)      Dificuldades no planejamento motor: ou seja, para planejar e executar movimentos corporais.

Neste ponto, faz-se muito importante a avaliação do perfil sensorial da criança, e saber, por exemplo, que tipo de estímulo a deixa alegre e quais lhe desagradam. A observação cuidadosa permitirá deduzir seu nível de sensibilidade a cada um dos sentidos, para que se passe a trabalhar de maneira a estimular conjuntamente o sentido que tem um processamento melhor com aquele que precise de um ajuste.

Na tabela abaixo, extraída do livro “Brincar é Desenvolver: Um caminho para o Mundo do Autismo”, pode-se ver comportamentos desagradáveis da criança e sugestões de como lidar nas referidas situações.

COMPORTAMENTO
ESTÍMULO SENSORIAL
IDEIAS DE TRATAMENTO
Bater a cabeça (estapear, esmurrar)
Proprioceptivo, vibração, linear, vestibular, pressão profunda – tátil
Compressão das articulações
Mini trampolim
Colete de peso
Balanceio
Linear – vestibular
Propriocepção
Sentar e brincar na bola
Tábua de equilíbrio
Ranger os dentes,
morder, pôr objetos na boca
Propriocepçao – vibração
Escova NUK, mini massageador, comidas que precisam ser muito mastigadas, mordedor de borracha
Pular, sacudir as extremidades, agitar as mãos
Vestibular- oscilação
Propriocepção, vibração Integração visual – vestibular
Mini trampolim
Trabalho pesado (empurrar, puxar, cair)
Alvo visual
Rodar objetos (outros objetos que se movem)
Vestibular – rotatório
Visual
Disco de flexão
Balanço de pneu
Senta e roda
Prender a respiração
Propriocepção
Vibração
Mini massageador
Apito de sirene
Soprar em Theraband
Cheirar
Olfatório, tátil, gustativo
Sabores e cheiros fortes


O livro referido traz, ainda, opções de atividades associadas a comportamentos “agradáveis” da criança e intervenções para melhorar seu nível de alerta (são duas tabelinhas maravilhosas, cuja leitura vale à pena!).

O “R” do programa diz respeito à relação que a criança estabelece com a família. Restando claro que é a família que presta o suporte para a criança durante a maior parte do tempo, busca-se uma ampliação da integração família-terapeutas, no intuito de melhor capacitar esta família para promover uma adequada estimulação da criança, e, por conseqüência, assegurar o êxito do programa.

É neste momento que se fala mais precisamente do floortime, como “tempo de chão”, no sentido de oportunizar pelo menos 20 minutos diários dos pais com a criança, no chão, brincando, com atividades direcionadas e orientadas pelos terapeutas para estimular os aspectos da criança que precisam se trabalhados.

Enfim, o programa integra profissionais de diversas áreas que, juntamente com a família, traçam um perfil da criança, para descobrir que aspectos precisam ser considerados no momento da elaboração do plano de ação individualizado que norteará o trabalho a ser realizado, normalmente por um período mínimo de dois anos.

Este é um pequeno resumo do que seja, na minha percepção, de acordo com o que vi no Workshop realizado em Recife e no livrinho que mencionei, o DIR/Floortime.

Quem quiser saber um pouco mais, pode consultar:

Ø      Brincar é Desenvolver: Um caminho para o mundo do autismo”, de Ariela Goldstein, Dawn Capelli e Patrícia Piacentini;
Ø      “Engaging Autism. Using the Floortime Approach to Help Children Relate Communnicate and Think”, de Stanley Greenspan;
Ø      www. floortimebrasil.blogspot.com
Ø      www.toi.med.br
Ø      www.icdl.com



terça-feira, 19 de outubro de 2010

Como não se apaixonar?

Aqui, algumas fotos da última viagem que fizemos.

A cada dia que passa, ela fica mais linda!

Beijo a todos.





segunda-feira, 18 de outubro de 2010

O QUE UM DIAGNÓSTICO TRAZ

Desde que descobrimos que o ritmo diferenciado de Leti para aprender as coisas deveria decorrer de uma causa patológica, e não de sua personalidade mais tranqüila, temos feito tudo que se encontra ao nosso alcance para fecharmos o seu diagnóstico.

Já passamos por dois neurologistas e dois geneticistas em Salvador, dois neurologistas em São Paulo e, por último, por um geneticista em Ribeirão Preto.

Retornando da viagem a Ribeirão Preto, me ative a pensar em qual deveria ser a minha reação no dia em que finalmente encontrar o tão almejado diagnóstico.

Por que precisamos dar um nome a tudo?

Todos os profissionais que já passaram pela vida de Leti, incluindo médicos e terapeutas, são uníssonos em afirmar que seja o que for que ela tenha, o tratamento que ela precisará é o que já vem sendo feito desde que ela tem 7 meses de vida: estimulação por fisioterapia, fonoaudiologia e terapia ocupacional.

E ela vem respondendo bem à estimulação, sempre aprendendo alguma coisinha, num ritmo peculiar, bem seu.

O fato de ela não apresentar perdas de aprendizagem deixa todos muito felizes, e mais tranqüilos para poder pesquisar o seu diagnóstico sem agonia.

A abertura de nova perspectiva de descoberta de diagnóstico me transportou para o mês de fevereiro de 2009, quando tudo indicava que Leti seria portadora de uma doença genética denominada prader willi.

Ela tinha pés e mãos pequenos, hipotonia motora, obesidade, características bem específicas do portador de prader willi.

Lembro-me que fizemos a pesquisa genética para o prader willi próximo ao carnaval e o resultado apenas sairia um mês depois.

Foi o mês mais tormentoso da minha vida!

Não só porque me encontrava diante de uma possibilidade concreta de diagnóstico para Leti (muita gente acreditava que ela teria prader willi), mas, principalmente, por causa dos efeitos reflexos da doença: hipertensão, diabetes, agressividade, tudo decorrente da hiperfagia ocasionada por interferências no funicionamento do hipotálamo.

Fiz o que acredito fazer a grande maioria das mães numa situação parecida: consultei o Dr. Google, e, obviamente, dei uma atenção muito maior aos aspectos negativos da doença, e comecei a sofrer pensando em como seria a nossa vida caso confirmássemos a suspeita do diagnóstico.

No Orkut, encontrei a mãe de um portador de prader willi, que tinha criado uma associação em São Paulo para ajudar famílias de portadores da síndrome, que me prestou muitos esclarecimentos sobre a doença e se pôs à disposição para o que eu precisasse.

Lembro que neste mês de espera do resultado do exame fizemos um cruzeiro com toda a família (que já havia sido programado com antecedência), o que ajudou a amenizar a ansiedade da espera. Mas, já no finalzinho da viagem, recebi um email dessa mãe, respondendo a uma pergunta minha quanto à expectativa de vida dos portadores de prader willi. Era de 30 anos, se não me engano.

Meu chão abriu! Como a expectativa de vida da minha filha poderia ser menor que a minha?! Eu suportaria, caso a minha filha realmente tivesse prader willi, a dor de perdê-la por conta das complicações da síndrome?

Neste momento, percebi que ter uma filha que precisasse de cuidados especiais era algo que já não me preocupava tanto, ante a possibilidade da minha princesinha poder ter problemas de saúde como hipertensão, diabetes, esteatose hepática, que pudessem comprometer sua expectativa de vida.

E pedi a Deus, com toda a fé que tinha e que resgatei neste momento de angústia, que livrasse minha filha de qualquer problema que comprometesse sua saúde.

O resultado estava previsto para sair num determinado dia, e não saiu. Mais um dia de angústia. No dia seguinte, tentávamos consultar o resultado pela internet e não conseguíamos. Ligamos para o laboratório, e nos avisaram que o exame apenas poderia ser entregue pessoalmente, e não disponibilizado pela rede.

Pensamos que o procedimento havia mudado porque o resultado havia dado positivo.

Fomos eu e Samir ao Laboratório DNA do Rio Vermelho. Era um fim de tarde de sexta-feira. Samir ficou no carro. Combinamos que eu pegaria o resultado, levaria fechado ao carro, e veríamos juntos. Fizemos conforme o combinado. Peguei o envelope e levei-o fechado até o carro e abrimos juntos. O texto do resultado continha apenas três linhas, mas a cada palavra que líamos o estado de tensão aumentava até que as últimas palavras encerraram nosso tormentoso período de espera: “Portanto, o paciente não apresenta a síndorme de Prader-Willi pelo teste realizado”.

Chorávamos compulsivamente de alegria e alívio. Ficamos por alguns minutos no carro nos abraçando e chorando. Me lembro como se tivesse acontecido ontem. Saímos do laboratório e fomos à Igreja do Bonfim agradecer a Deus pelo resultado, era como se tivéssemos tirado o peso do mundo inteiro das nossas costas.

Mas o fato é que, embora Leti não seja portadora de prader willi, ou de qualquer outra síndrome genética detectada pelo CGH-Array (e são muitas que o exame detecta), a sensação de alívio que nos invadiu naquele dia não permanece até hoje, porque sabemos que o seu atraso global de desenvolvimento decorre de alguma causa que talvez nunca conheçamos.

E, para mim, é importante conhecer o diagnóstico para poder ter ideia de prognóstico. Embora ninguém saiba como seu filho estará nos próximos 5, 10 ou 20 anos, há uma expectativa que o ciclo vital de uma criança típica siga uma seqüência mais ou menos parecida.

E não sei se isso acontecerá como minha filhota. Não sei se o problema que ela tem comprometerá sua vida para sempre, se poderá ser reversível ou estabilizado com terapias, se haverá algum problema de saúde associado. E isso me angustia. Mas essa angústia já não me paralisa. Não posso negar que de vez em quando (e isso tem acontecido com bem menos freqüência) tiro uma noite para chorar de tristeza por me encontrar nessa zona de incerteza quanto ao diagnóstico. Mas isso não dura mais que uma noite, e ocorre pouquíssimas vezes por ano.

Enquanto isso, vou cuidando da minha filha, fazendo tudo o que posso para lhe proporcionar uma estimulação adequada, para que sua evolução continue acontecendo e, quem sabe, até num ritmo mais acelerado.

Mas sinceramente, não sei como ficarei no dia em que finalmente estiver cara a cara com o tão esperado diagnóstico. Acho que vai depender muito de qual seja, mas seja qual for, acredito que estarei envolvida por um sentimento dúbio, um misto de alívio - por finalmente descobrir o que minha filha tem - com tristeza, por não mais poder alimentar a esperança, que vive escondidinha no meu coração, de que talvez ela não tenha nada.
Sempre gostei de escrever. Adolescente, adorava fazer diários, agendas customizadas, cadernos de dedicatórias e coisas afins.

Na verdade, sempre me senti invadida por uma sensação nostálgica de medo de esquecer momentos importantes que havia vivido, e escrevê-los dava-me a sensação de poder eternizá-los em minha memória.

Confesso que depois de adulta nunca parei para ler esses diários, agendas e cadernos, embora todos continuem guardados no armário da garagem caso sinta uma necessidade urgente de resgatar aqueles momentos.

Com a chegada dos meus filhos, passei a escrever sobre eles, também imbuída de um medo enorme de esquecer momentos tão preciosos de sua infância.

Retomei o hábito quando Lipe tinha aproximadamente dois anos de idade. E, ao contrário dos diários esquecidos na garagem, vira e mexe, me pego lendo o caderninho do Bob Esponja para relembrar de suas peraltices e curiosidades. É uma delícia!

Como já tinha construído o hábito em relação a Lipe, com Leti comecei a fazê-lo desde o seu nascimento.

E como isso me ajudou.

Ter o registro do seu comportamento, da sua evolução, das minhas impressões sobre o seu dia-a-dia foi muito importante para poder subsidiar a investigação dos médicos quanto à causa do atraso global do seu desenvolvimento quando ficou constatado que ela deveria ser portadora de alguma patologia neurológica ou genética, comprometedora deste desenvolvimento.

Vendo a importância dos registros, resolvi consolidá-los num documento que chamei de Relatório Materno, que é atualizado periodicamente, e entregue a cada profissional que passa a fazer parte da vida da minha filha.

Mas comecei a sentir uma necessidade maior de escrever. Na verdade, uma vontade enorme de compartilhar as experiências novas vividas com o vai-e-vem de Leti a terapias, médicos, e tantos profissionais envolvidos no nosso processo de busca de diagnóstico e de melhora no seu estado de desenvolvimento.

Por isso a ideia do blog.

A intenção é compartilhar experiências, informações, angústias; proporcionar aos amigos que não têm oportunidade de nos acompanhar de perto a possibilidade de saber o caminho que temos trilhado e os resultados que temos alcançado; conhecer pessoas que vivam situações parecidas e novidades nesse imenso campo do neurodesenvolvimento...

Criar o blog me motivou a estudar mais sobre teorias e técnicas desenvolvidas para tratamento de crianças especiais, para poder escrever um pouco sobre a minha impressão sobre estes temas, dando conhecimento a quem ainda não os conhece, e oportunizando a discussão com aqueles que os conheçam.

Assim, você está sendo convidado a compartilhar um pouquinho da vida de Letícia e dos relatos e impressões de uma mãe apaixonada, que vive numa incansável busca pela melhoria da qualidade de vida da sua filha.

Enjoy it!
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