segunda-feira, 23 de março de 2020

10 Dias de Distanciamento Social

Sim, eu aprendi a diferença entre isolamento, quarentena e distanciamento social. Aprendi também que um problema que acontece do outro lado do mundo logo pode atingir a minha vida e a minha rotina. Aprendi que nossas bolhas não nos protegem de nada e que algumas vezes é preciso pensar primeiro no outro para garantir a nossa proteção. Aprendi que ter informação é bom, mas o excesso dela às vezes pode nos levar ao desequilíbrio. Aprendi a valorizar mais pessoas muitas vezes tão invisibilizadas. Percebi a importância de fazer a escolha certa do nosso parceiro de vida. Aprendi a exercitar mais a gratidão. Tive oportunidade voltar a enxergar beleza em pequenas coisas para as quais o ritmo acelerado da vida parecia estar me cegando...

Há dez dias, quando optamos, pela flexibilidade de nosso trabalho, que nos autoriza o home office,  por fazer o distanciamento social, não imaginávamos o que nos aguardava.

Apesar de já trabalharmos parcialmente em home office, passar a trabalhar desta forma em tempo integral e com a casa cheia é completamente diferente! 

Temos tentado - diariamente - aprender uma forma para conciliar todas as demandas da família,  de maneira que nos permita conservar a harmonia, o respeito e o equilíbrio.

E tem sido na base da tentativa e erro, já que cada membro da nossa família tem reagido diferente ao momento que estamos vivendo.

Com Mateus, montamos (junto com ele), desde o segundo dia, um quadro de rotina com coisas a fazer durante cada dia da semana, incluindo tempo para brincar, estudar, ler, cuidar do seu espaço e do seu corpo... Tem funcionado super bem, principalmente porque o usamos como direcionamento, e não como algo rígido ou inflexível.

Com Leti, na primeira semana, optamos por deixá-la mais à vontade e ir decidindo o que fazer dia a dia, de acordo com seu humor e comportamento. E embora, dos filhos, ela seja a que menos gosta de sair, tem sido a que mais sente falta da sua rotina de escola e terapias. Quase todos os dias, lembra de seus compromissos e depois completa: "mas tá fechado por causa do corona vírus", com uma expressão triste. Ela anda mais ansiosa, mais agitada e se machucado vez por outra. Temos conversado muito com ela, tentando explicar o momento, estar mais juntos e fazer coisas que sejam prazerosas.

Lipe está entediadíssimo! Passa a maior parte do tempo nas redes sociais e conversando com amigos, mas sempre reserva um tempinho para estar conosco, conversando sobre a crise, jogando jogos de tabuleiro, compartilhando as horas das refeições. Mas sempre repete que não vê a hora de colocar a cara na rua. É adolescente! Perfeitamente compreensível.

Entre mim e Samir as coisas fluem de maneira leve. Temos usado as 24 horas que compartilhamos para trabalhar lado a lado, nos dividir (ou nos juntar) na atenção com as crianças, conversar mais, nos curtir mais. Tem sido bom.

E se precisamos extrair do limão a limonada, temos tentado tornar estes momentos leves e felizes para todos. Sem exigências, sem peso, sem cobrança. Minha ideia é planejar e fazer quando der,  e, quando não der, que fiquemos ao Deus dará, nos entregando ao ócio, e esperando o que a experiência nos proporcionará.

Tenho recebido diversas sugestões de coisas para fazer com crianças, olhado, usado o que me interessa, mas com a consciência de que nos dias de cansaço excessivo, de trabalho além da conta, de vontade de estar só comigo ou de curtir meu marido, tudo poderá ser deixado de lado, com as crianças ocupadas por horas a fio na TV. E não é isso que as estragará.

Mas enquanto temos disposição e criatividade, seguimos entretendo os pequenos como podemos.

Aqui, alguns de nossos momentos, nestes primeiros 10 dias:

Atividades ao ar livre quando ainda era possível

 


Crianças na Cozinha:

  


Brincando com brinquedos pouco explorados:


 



Fazendo Arte:


 
  




Piquenique com leitura em casa:



Cinema e Teatro em casa:


Ajuda nos afazeres domésticos:

 


 Caça ao tesouro (com leitura de palavrinhas para Leti):

 


Hora da Leitura:

 




Brinquedos construídos e brincadeiras:


 
Fazendo um livro
 
 






 


Hora de estudo:

 



domingo, 15 de março de 2020

Lidando com as dificuldades: paciência e persistência



O início do ano tem sido sempre difícil para Leti. Ela fica mais ansiosa, menos aberta às atividades, indisposta a passeios. E, invariavelmente, pega uma gripezinha, que acaba por deixá-la ainda mais desanimada. Se pudesse, ficava o dia inteiro em casa, assistindo a vídeos do youtube no tablet e "brincando" de desenhar com a saliva em sua coleção de lençóis 100% poliéster.

O início do ano para Mateus (nos últimos três, pelo menos) tem sido de readaptação à rotina escolar. Época de relembrar conteúdos já vistos, de tentar estabelecer um horário de estudo, de se deparar com as dificuldades e procurar estratégias para superá-las. E, a partir do ano passado, de tentar lidar com os sintomas da psoríase, exacerbados por conta do stress decorrente de todo este processo.

No ano passado, depois de muito caminhar para tratar os sinais da psoríase espalhados pelo corpo dele (e foi uma longa e cansativa caminhada!), acolhendo a sugestão da psicóloga de Leti, experimentamos contratar uma professora particular para acompanhá-lo, diariamente, nos estudos e nas atividades de casa, para que eu pudesse me desvencilhar do clima de cobrança a que ele mesmo se impunha, buscando me comprovar suas competências.

O resultado foi quase imediato! Sem mudar a medicação que ele estava usando (e depois de tentar, sem êxito, tratamento local e fototerapia), todas as descamações da pele simplesmente desapareceram! 

Mas, por outro lado, eu - talvez por conveniência ou cansaço - acabei me alheando ao processo escolar do meu filhote. 

Como um ano novo demanda novas ações e novos planos, estabeleci como prioridade deste ano de 2020 ajudar - pessoalmente - meus filhos em suas dificuldades escolares.

E tem sido assim desde o início do ano letivo. Muito mais com Mateus que com Leti, é verdade, já que o ritmo dela ainda não deslanchou. E dentro deste processo, uma observação hoje me deixou bem reflexiva e motivou a escrita deste post: a postura de Mateus diante de suas dificuldades.

A grande dificuldade dele, que acaba impactando em todas as disciplinas, é, sem dúvida, a interpretação de texto. E a consciência da dificuldade faz com que ele crie estratégias - altamente questionáveis - para dar solução aos 'problemas' que precisa resolver, tentando burlar sua dificuldade. Ele mal lê os textos que precisa interpretar, buscando entendê-lo através de outros elementos disponíveis na atividade, responde questões com evasivas e insiste veementemente para que eu não olhe sua atividade de casa, alegando que vai corrigi-la em classe. E o que é pior, e acendeu o meu alerta para a necessidade de uma intervenção: ele vem se opondo à leitura dos livros da nossa biblioteca.

Meu foco com ele, então, tem sido a interpretação. E não só nas atividades de língua portuguesa, mas em todas, inclusive matemática, na qual ele conta com a grande vantagem de possuir um excelente raciocínio  lógico!

Temos procurado estabelecer uma rotina e alguns combinados para que ele se aproprie de suas responsabilidades e, aos poucos, consiga exercitar plenamente sua autonomia frente aos compromissos escolares.

Não posso dizer que tudo são flores. Longe disso. Só de ver um texto a interpretar, principalmente se for longo, ele resmunga, vocifera, pragueja, busca culpados por sua vida tão cruel... um verdadeiro drama!

Mas, mesmo com sua postura reativa, consigo ver avanços; uma leitura um pouco mais fluida, menos medo de arriscar suas impressões sobre o texto...

Mas é tudo muito lento! Procuro validar seus avanços, para ele se motivar e reforçar sua autoestima, mostro que todo mundo tem dificuldade (cada um em uma área) para ele perceber que isso é natural, e deixo claras as regras (com suas razões e consequências) para ele tentar compreender a importância de se implicar neste processo.

Antes de sentar com ele, visto a roupa da paciência, coloco a capa da persistência, e me preparo para o combate!

Mas alguns dias são especialmente mais difíceis! Ele protela o horário de fazer a atividade, sempre sob o pretexto de fazer alguma outra coisa (e briga como gente grande quando quer ver TV e digo que não pode porque a atividade não está pronta), senta para fazê-la apenas quando eu o convoco, porque já não dá mais para esperar e, quando percebo os erros (na maioria das vezes decorrentes da má interpretação da pergunta), ele grita, chora, mexe os braços e se vitimiza, dizendo que EU não quero dar a resposta, EU não quero que ele veja TV, EU quero estragar o dia dele, EU blábláblá...

Procuro não alterar o tom de voz e repetir o discurso quantas vezes sejam necessárias, explicando que estou a seu lado para ajudá-lo, que dar a resposta a ele não o ajuda porque não poderei estar com ele o tempo todo para responder por ele, que o conteúdo de hoje é a base do de amanhã e tudo isso que a gente já sabe, mas confesso que às vezes me canso.

E nestes momentos, para não brigar e gritar, digo francamente a ele que sua postura está me deixando extremamente irritada e impaciente e que, para não brigar e gritar, preciso me afastar um pouco para eu - e ele - esfriarmos a cabeça. E saio da mesa, vou para meu quarto, pedindo a ele que, quando se sentir pronto para continuar, me chame.

Não sei se está certo. mas como não encontrei um manual que caia como uma luva a nossa relação, é o que meu coração tem me mandado fazer. E sigo fazendo até pensar em algo diferente.

Com Leti é diferente. Ela não grita, não briga, não pragueja. Mas, diante das dificuldades, quando se encontra nestas má fases, parte para a autoagressão. Já passou por vários estágios: bater a testa na parede, morder o braço, machucar a língua.

Isso me tirava do eixo! Me deixava transtornada com a sensação de impotência, e me fazia apelar para várias reações diferentes: conversar, brigar, ameaçar, até chorar na frente dela (depois de chorar escondido incontáveis vezes).

Ultimamente, tem mordido a língua. Minha postura diante dessa atitude dela vinha sendo sinalizar que precisaria tratar com própolis (que ela detesta!), como orientado por sua médica. Era uma ameaça camuflada por uma boa justificativa, já que ela se debatia como podia para não deixar usar o própolis.

Mas mudei.

Tenho dito a ela que ela está uma mocinha, que mostra ter capacidade de dizer o que sente (esta noite, inclusive, acordou de madrugada pedindo novalgina porque não estava se sentindo bem e, quando acordou, disse que tinha acordado feliz porque se sentia melhor) e que não tem porque se machucar se algo a está incomodando. Percebo que ela usa a autoagressão como forma de comunicação mas também como uma espécie de chantagem, porque ela não morde a língua e fica na dela, remoendo o incômodo que a motivou. Depois de morder, imediatamente nos procura para mostrar o que fez. 

Quando faz isso, repito o que sempre digo, que ela pode conversar a respeito do que a está incomodando sem se machucar, mas que, infelizmente, se ela optar por isso, não poderei fazer nada, já que não tenho como controlar a língua que está dentro da sua boca. Tento demonstrar serenidade, diferente do descontrole que sempre me invadiu diante dessas situações, reforçando que não quero mais me angustiar com isso. (claro que esta opção só se faz possível porque o resultado da autoagressão não é nada que comprometa sua saúde ou integridade)

Novamente não sei se está certo. Mas é o que tenho tentado dentro desta minha árdua tarefa de exercitar a tentativa e erro com meus pequenos.

O fato é que perceber a reação de meus filhos diante de suas dificuldades desencadeia em mim a minha reação diante das minhas dificuldades. E, invariavelmente, junto com a atitude, que busca ser racional, vem um monte de sentimento que me faz questionar minha maternagem, minhas responsabilidades e as boas e velhas culpas, que se escondem no inconsciente, buscando sempre uma oportunidade para vir à tona.

Seja como for, sigo tentando usar o uniforme da paciência e persistência diante dessas situações. Se o resultado será positivo, só o tempo dirá.
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