domingo, 1 de novembro de 2015

A Consulta (continuando...)

Apesar de ter ficado mais tranquila com a acolhida do médico, só depois pude constatar que, ainda assim, eu não estava no meu estado normal. E no final ficará claro por quê.
 
Superadas as dúvidas iniciais, falei que estávamos ali para tentar saber o que fazer com os episódios de autoagressão de Leti e para buscar auxílio para melhorar a sua qualidade de sono.
 
Antes de abordar os pontos específicos em questão, ele nos explicou, de uma maneira possível de compreender, um pouco sobre o funcionamento cerebral, mostrando, em alguns momentos, como reações de Leti demonstravam a hiperexcitação cerebral característica dos autistas.
 
Nos explicou que o limiar alto de Leti para a dor a permitia usar dos episódios de autoagressão para buscar se reorganizar em momentos de euforia; ou por alegria, ou por contrariedade. E que, apesar de por vezes nestes casos ser recomendável o uso de medicação, seria conveniente avaliar bem se o tratamento terapêutico não seria suficiente.
 
Explicou que a hiperexcitação decorre dos elevados níveis de cortisol (que descobri depois ser o hormônio do estresse) e que uma forma recomendada para tentar nivelar os níveis de cortisol, que podem levar aos atos de autoagressão, seria uma dose extra de ocitocina. A surpresa foi que a ocitocina prescrita não viria em forma de medicamento, mas de amor. Achei tudo meio inusitado, mas diante da confiança que o médico me passou, saí de lá convencida! Ele nos orientou que nos momentos em que Leti estivesse fazendo uso de autoagressão chegássemos mais perto dela para abraçá-la, beijá-la, ou fazer uma brincadeira que a agradasse, deixando bem claro o nosso amor por ela (muito mais do que o amor demonstrado nos simples atos do dia a dia). Explicou que nestes momentos o pai e a mãe liberam maiores doses de ocitocina que podem auxiliar os filhos autistas na autorregulação.
 
Depois da consulta o que fixei foi: autoagressão-amor-ocitocina-regulação. Hoje, para tentar relembrar a explicação e deixar o post mais informativo, fui pesquisar na internet a relação entre o autismo e a ocitocina e encontrei um texto bem afinado com que o médico nos passou no momento da consulta  (se alguém tiver interesse em consultar, o link: aqui).
 
Já havia lido, e ouvido numa palestra, que para as hipóteses de (auto)agressão, a medicação recomendável seria a risperidona que, como efeito colateral, causava o excesso de peso, o que me deixou preocupadíssima diante da obesidade de Leti.
 
Ele mencionou a possibilidade de uso da risperidona, falou dos efeitos colaterais, mas acho que, como eu havia dito que ela não estava mais tirando sangue da boca, que foi o que me deixou em pânico e me fez procurar ajuda, entendeu que poderia esperar um pouco antes da eventual prescrição. Saímos, portanto, com a recomendação do uso irrestrito da ocitocina natural e com a solicitação de um eletroencefalograma para mapear o funcionamento do cérebro, para depois pensarmos em outras intervenções.
 
Quanto ao sono, antes de falar sobre o que poderíamos fazer para melhorá-lo, tentou nos explicar um pouco sobre o seu funcionamento.
 
Vou tentar fazer um resumo pelo que me lembro das informações, sem pesquisar nada na internet, o que não significa que seja exatamente o que ele disse.
 
Ele explicou que nosso cérebro, em atividade  e em estado normal, funciona a uma frequência de até 10Hz e que, quando vamos dormir, a frequência precisa reduzir para algo em torno de 1 a 4Hz, para que possamos adormecer e passar por todos os estágios do sono.
 
No autista, por conta da hiperexcitação, a frequência de atividade pode chegar até 40Hz, o que torna mais difícil a redução para a estabilização necessária para o sono.
 
Disse, ainda, que precisamos ultrapassar todos os estágios do sono para a manutenção da saúde. (Confesso que, chegando aqui, bateu curiosidade e fui pesquisar no Dr. Google para me lembrar com mais propriedade das informações de Dr. Caio).
 
Vamos lá!
 
Vou transcrever o que encontrei no texto lincado aqui, por traduzir o que me lembro da consulta.
 
O sono divide-se em dois estágios básicos: o REM e o NREM.
 
"O REM é caracterizado pela intensa atividade cerebral, muito semelhante ao estado de vigília, nessa fase ocorrem movimentos oculares rápidos, o que explica o nome do estágio. É no REM que ocorrem os sonhos. Embora a fase do REM não resulte em um descanso profundo, ela é importante para nossa recuperação emocional."
 
"A fase do NREM é muito importante para o corpo, uma vez que é nela que ocorre a secreção dos hormônios do crescimento, sendo também essencial para a recuperação de energia física. É na fase NREM que realmente existe o descanso profundo e menor atividade neural. Após a fase 4, o indivíduo retorna ao estágio 3, estágio 2 e entra na fase REM."
 
"O estado do NREM corresponde a 75% do período do sono, sendo dividido em quatro fases:

- Estágio 1: É a fase de sonolência, onde o indivíduo começa a sentir as primeiras sensações do sono. Nessa fase a pessoa pode ser facilmente despertada;

 - Estágio 2: Dura em média de 5 a 15 minutos. No estágio 2 a atividade cardíaca é reduzida, relaxam-se os músculos e a temperatura do corpo cai. É bem mais difícil de despertar o indivíduo.

 - Estágio 3: Muito semelhante com o estágio 4, diferencia-se apenas em relação ao nível de profundidade do sono, que é um pouco menor.

 - Estágio 4: Dura cerca de 40 minutos. É a fase onde o sono é muito profundo."
 
Explicou que cada estágio dura cerca de 45 minutos e que, muitas vezes, a pessoa passa direto do estágio 2 para a fase REM.
 
Um outro texto que li há pouco, diz que "O ciclo completo em uma noite de sono é extremamente importante para garantir um equilíbrio físico, químico e mental para um indivíduo. Noites mal dormidas podem resultar em irritabilidade, depressão, dificuldades com a memórias e muitos outros problemas que podem atrapalhar muito a vida de um indivíduo." (ele completo: aqui)
 
Fez toda esta introdução antes de mencionar que a exposição a estímulos fotoelétricos até duas horas antes de dormir podem elevar a atividade cerebral até 400Hz, o que dificulta muito mais a estabilização necessária para entrar na frequência adequada ao sono.
 
Por isso, aconselhou, o que já havia sido aconselhado por Dra. Milena Pondé, aqui em Salvador, mas com uma antecedência menor, que suspendêssemos toda exposição a estímulos fotoelétricas por duas horas antes de dormir.
 
Prescreveu também o uso de melatonina, sugerindo que comprássemos fora.
 
Além da melatonina, prescreveu o Speak e o Learn, não para a finalidade de falar ou aprender, mas por conta da concentração do ômega 3 e sua função antioxidante, sugerindo também que comprássemos fora.
 
Solicitou alguns exames e, por deixar claro que acredita no tratamento terapêutico, com foco na integração sensorial, sugeriu a manutenção das terapias que já faz e a inclusão de aulas individuais de judô, para trabalhar seu corpo, contato, motricidade grossa; e aulas de artes.
 
Saí da consulta com as prescrições, com o telefone celular do médico e com uma infinidade de coisas fervilhando na cabeça, mas que não consegui elaborar para questionar no momento.
 
A madrugada seguinte, em que Leti acordou às 4 da madrugada, e me beliscou a noite toda, sem querer dormir novamente, o que, de fato, não aconteceu, foi o que me levou a perceber que tinha esquecido de expor para ele o discurso que tinha afinado com a terapeuta da Ciranda, antes da viagem: questionaria como lidar com a grande ansiedade de Leti que, segundo percebemos, impulsiona sua compulsão alimentar, seus atos agressivos a terceiros (os beliscões e mordidas quando está eufórica ou chateada) e os autoagressivos.
 
Perceber meu esquecimento me fez perceber também minha falta de concentração para o trabalho nos últimos dias, meu nervoso excessivo para me expor em público e questõezinhas outras que vêm me fazendo entrar num processo de autoconhecimento, desconstrução e reconstrução que, acredito, renderá bons frutos.
 

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