Descobrir que seu filho é portador de uma necessidade especial não é fácil! Honestamente falando, nenhuma mãe, quando está grávida, sonha em ter um filho autista, PC, down, ou portador de qualquer necessidade especial. Pode parecer cruel falar isso assim, “na lata”, mas é verdade. Toda mãe idealiza seu filho, faz planos, acredita poder livrá-lo de todo e qualquer mal.
Mas mãe é mãe. E quando nasce um filho, nasce também uma mãe, pronta a atender seu pequeno em todas as suas necessidades: é seu leite que o alimenta, seu corpo que o acolhe, sua voz que o acalma. O bebê, nos primeiros meses de vida sente-se um extensão do corpo da sua mãe.
E se este bebê tem alguma necessidade a mais, sem dúvida, a primeira pessoa que estará pronta a atendê-la será a sua mãe.
Acredito que toda a família da criança especial, inicialmente, passa por uma fase de negação, que, é preciso que se diga, não significa rejeição à criança. Negação à situação, à possibilidade daquela criança ter algum problema que possa comprometer sua qualidade de vida, quando o que se desejaria é que se pudesse assegurar sua imunidade até a uma singela dor de cabeça.
São muitos por quês que passam pela nossa cabeça. É uma fase de adaptação, que tem um tempo próprio para cada membro da família.
Não foi diferente conosco.
Tive minha fase de negação, embora não tivesse consciência disso. Evitava as conversas de elevadores, para que não me perguntassem quantos meses Leti tinha, quando ela já tinha mais de 1 ano; tentei não ir ao interior de Samir, para não ter que enfrentar os olhares curiosos das pessoas quanto ao estágio de desenvolvimento dela; restringi seu convívio, por algum tempo, às pessoas mais próximas, para não ter que dar explicações a respeito de suas limitações.
Com a suspeita do prader willi, senti uma necessidade grande de dividir minha angústia com outras pessoas.
Até então, tirando Samir, meus pais, Binha, Felipe e Érika, não falava muito sobre o assunto com mais ninguém.
A partir daquele momento, passei a conversar mais com outras pessoas: amigos próximos, colegas de trabalho e alguns familiares. E é impressionante como tudo fica mais leve quando temos com quem dividir nossas angústias, medos e preocupações.
Lembro-me que no dia em que saiu o resultado do exame de prader willi, fiquei um tempão no celular, ligando para todos que estavam torcendo por nós, para dizer que o resultado havia dado negativo. Dividir a alegria também é muito bom!
Samir passou por um processo diferente. Neste mesmo dia do resultado, lembro-me que não ligou para mais que três pessoas. Ele não conversava sobre o assunto. Seus amigos, familiares, colegas de trabalho não conheciam o estresse emocional que estávamos vivendo. Só depois de quase um ano, ele contou a serventuários do fórum que trabalhavam com ele que Leti era uma criança especial, e porque eles logo fariam a constatação ao chegar para jantar em nossa casa.
Mas ele nunca economizou na demonstração de um amor imensurável a sua princess, o que reforça a afirmação que a negação de que falo nada tem haver com rejeição.
Quem conhece Samir, sabe o pai maravilhoso que ele é, daqueles que fazem tudo: dá de comer, nina, dá banho, troca fraldas, acorda de madrugada, leva para passear, assiste (curtindo) dvd junto, acolhe e cuida no momento da doença, percebe quando está com febre, com sede, enche de vontades...
Mesmo vivendo o momento dele de negação, ele sempre foi um pai maravilhoso e apaixonado. E, no tempo dele, venceu a negação e passou a dividir com aqueles que o cercam a certeza de ter como filha uma criança especial, para nós, fonte de inesgotável amor.
Vencida a negação, constatamos a importância dos amigos nessa nova etapa de nossa vida.
Queria, portanto, dedicar esse post aos amigos: Amigos-amigos, amigos-parentes, amigos-colegas de trabalho, amigos-conhecidos, amigos-profissionais. Todos eles possuem um papel importante em nossa caminhada.
Em primeiro lugar, a meus pais, incluídos na categoria amigos-parentes.
Como Samir precisa ficar a semana inteira no interior, por conta do trabalho, fica mais difícil conciliar a vida de profissional, de dona de casa, de mãe de um filho de 8 anos, numa fase de mudanças e descobertas, de mulher e de esposa, com a maratona de Leti, que inclui duas sessões semanais de fisioterapia, fonoaudiologia e terapia ocupacional, além de escola, natação, consultas médicas, dentre outras atividades.
Aí entram meus pais. O suporte que eles me dão, desde o início, permitiu que eu pudesse cuidar da minha filha e da minha vida, sem precisar esquecer-me de mim. Além do apoio efetivo, representado pelo compromisso em levar Leti a algumas de suas atividades, o suporte emocional que eles me dispensam faz a diferença. É impressionante o poder de um colo de mãe na hora em que a vontade de chorar vence nossas forças.
Depois, a minha irmã. Sem dúvida, uma segunda mãe para os meus filhos. Binha é aquela pessoa disponível em todos os momentos, aquela tia carinhosa, apaixonada, cuidadosa, brincalhona. Assume meus filhos a qualquer momento, mesmo tendo um bebê lindo, de onze meses, em casa. É minha grande amiga e confidente, companheira para todos os momentos.
Logo em seguida vêm os amigos. Amigos-amigos, amigos-parentes, amigos-colegas de trabalho, amigos-profissionais que acompanham de perto nossa rotina, que se preocupam, que vibram, que aconselham, que protagonizam conosco a nossa história.
Fico feliz de ter escolhido o caminho da abertura, e não o da reclusão, em relação à questão da minha filha.
Hoje não me sinto mal quando me perguntam quantos meses minha filha tem, respondo, com muita naturalidade, que já tem dois anos, mas que é especial e tem o desenvolvimento compatível com um bebê de idade entre 11 meses e 1 ano. As pessoas se solidarizam, conversam abertamente, não sobra espaço para especulações.
Adoro falar sobre seus progressos e descobertas, sobre minhas dúvidas e preocupações, adoro compartilhar histórias de outras crianças especiais. O blog veio publicizar este movimento.
E como tem sido gostoso receber as manifestações de carinho, através de comentários aos posts e emails, de amigos que conhecem nossa história, de outros que ainda não a conheciam e até de pessoas que, apesar de não fazerem parte do nosso círculo de amizade, já se apresentam como simpatizantes da nossa causa.
A inclusão começa em casa. E começa com a aceitação. Essa etapa para nós está superada. E temos um exército de amigos que nos ajudará a vencer todas as outras que ainda estão por vir.