quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Um TOM, mil tons...

No meu aniversário de 40 anos, há pouquíssimo tempo, portanto, ganhei de presente de uma amiga querida um livro. Até aqui, nada demais. Quem nunca ganhou um livro de presente? (eu, inclusive, adooooro ganhar livros de presente #ficaadica rs) Mas eu disse que se tratava de um livro infantil? Não? Pois, sim, era. Talvez seja um ato elogioso dar um livro infantil de presente a uma quarentona. Ou não. Vai saber... Mas daquela amiga em especial, que, além de ser uma parceira de projetos e programas ligados à infância livre,  sempre foi uma confiável referência de literatura infantil, só poderia esperar, no mínimo, uma agradável surpresa.
 
No livro, uma singela e intrigante dedicatória:
 
"Jana,
Desde a primeira vez que vi este livro lembrei de você e do seu trio.
Acho que ele sempre foi seu! Que a vida seja doce nos próximos 40!"
 
Não precisei ler tudo para entender porque aquele livro parecia ter sido sempre meu.
 
Trata-se do livro TOM. O livro narra a intrigante estória de um garoto que percebe a diferença do seu irmão, sempre mergulhado em seu infinito particular (plagiando Marisa Monte), questiona-se sobre as peculiaridades dele até conseguir, finalmente, compartilhar do seu mundo.
 
 
O texto é sutil e delicado, falando tanto através do dito como do não dito, e a ilustração é... impactante! (confesso que fiquei uns bons minutos com os dedos sobre o teclado procurando uma palavra que melhor traduzisse o forte sentimento que as ilustrações provocaram em mim, mas não consegui encontrar nada mais adequado).
 
Encontrar o livro na lista de paradidáticos da turma de Mateus no início deste ano me emocionou! De verdade. De fazer marejar meus olhos. Abstraído o fato de ficar privada do livro por um ano em nossa biblioteca, restou um sentimento de absoluta gratidão, por acreditar, talvez tomada pelo sentimento pouco nobre da vaidade, que aquela escolha pudesse ter sido pensada para nós, já que Mateus poderia facilmente ser identificado com aquele garoto inicialmente confuso em relação ao comportamento do irmão e por ver refletido em Tom um pouco de Letícia, em suas idiossincrasias. Gratidão por perceber o compromisso da escola em ampliar o debate, trazendo um tema tão importante para a reflexão de crianças tão novas. Gratidão por perceber o brilho nos olhos da equipe ao anunciar que na Festa Literária deste ano o autor do livro estaria na escola, conversando com as crianças sobre a obra.
 
Apesar de pulsante, a emoção ficou meio contida no meu peito até o início desta semana quando, finalmente, André Neves, o autor, chegaria a Salvador para a FLAI - Festa Literária da Escola Arco Íris.
 
Só ontem, no insta do blog, mencionei a emoção que acabei de descrever, concluindo com um velado, inconveniente e desesperançoso apelo que me oportunizassem participar da conversa sobre TOM. Eu desejava TANTO conhecer as entrelinhas do livro...
 
Obviamente minha intromissão no momento das crianças não foi franqueada, mas, para minha agradável surpresa, toda a conversa foi transmitida ao vivo pelo instagram, a qual pude assistir, com calma, hoje na hora do almoço.
 
Em verdade, assisti a primeira vez no carro, quando saía do trabalho para buscar as crianças na escola - mas juro que só ouvia pelo bluetooth, deixando as imagens para as outras três vezes em que vi o vídeo de novo na hora do almoço - o que já foi suficiente para me fazer chegar na escola com os olhos vermelhos de emoção ao perceber as sacadas das crianças e o tato de André Neves para tratar da abstração do seu livro retratada na sua ilustração tão peculiar.
 
A primeira pergunta que lhe fizeram foi a primeira observação de Mateus ao ver o livro pela primeira vez: - por que os pássaros atravessam o corpo dele?
 
Foi o gancho para falar da diferença do outro e da invisibilidade que muitas vezes imprimimos às coisas que não queremos ver; para falar também de imaginação, de desejo de liberdade, de encontro...
 
Ele ressaltou a importância da leitura das imagens, tanto quanto a do texto, pedindo atenção à última página do livro, desprovida de texto, na qual as crianças conseguiram perceber uma maior humanidade em Tom, no momento em que permite ao irmão o ingresso em seu mundo.
 
Finalizou contando um pouco da história do filho de um amigo baiano que inspirou o livro e explicando que apesar desta característica de Tom ter um nome - autismo - cada um de nós tem um pouco de Tom dentro de si.
 

 
Fiquei EN-CAN-TA-DA com a abordagem dele com as crianças; com a naturalidade com que tratou da diferença, muito bem compreendida pelos pequenos, e com o fechamento com um nome - autismo - que dá uma concretude a algo que poderia soar demasiado abstrato para as crianças e promove a sua desestigmatização, diante do contexto tão leve e lúdico.
 
Cheguei na escola tomada por uma enorme vontade de abraçar André Neves e lhe dizer o quanto suas palavras - ditas e escritas - me tocaram. Mas ele já tinha saído para o almoço.
 
Mas eis que, hoje à noite, assim que cheguei na escola para os eventos abertos da FLAI, fui imediatamente abordada por duas queridas da escola que me diziam que o escritor tinha tomado conhecimento da minha cara de pau, ops, história e queria também me conhecer.
 
Pausa para um mini infarto. rs
 
Depois de enfrentar a fila para os autógrafos, pude, finalmente, estar cara a cara com este talentosíssimo escritor e ilustrador para tentar lhe dizer o que seu livro representava para mim e lhe dar o abraço que, no fim  das contas, foi o que, de fato, sintetizou mais fielmente a minha gratidão por sua sensibilidade ao nos apresentar um Tom, com os mil tons que o habitam, que transcendem suas excentricidades e desembocam na sua humanidade.
 
Enriquecido o acervo da nossa biblioteca, resta-nos agora tentar apurar o olhar para extrair  das recém adquiridas obras primas do autor toda a riqueza que elas certamente escondem.
 
 
 
 
Novo acervo da nossa biblioteca
 

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